En el bosque é uma joia. Essa foi a primeira frase que me veio à cabeça quando toquei o livro: constituído por uma pequena caixa que inclui um caderno ilustrado que reproduz fragmentos do discurso de Ana María Matute por ocasião de seu ingresso na Real Academia Española em 1998 e nove cartões ilustrados.
O artefato recupera um pouco da história de Matute, autora precoce e muito premiada: sua trajetória começa cerca de quarenta anos antes de seu discurso, aos 16 anos, quando ela arrebata o Prêmio Planeta de narrativa. Sempre comprometida com uma leitura da infância, em suas distintas nuances, a escritora trilhou um caminho fecundo ao longo da historiografia literária espanhola e mundial, sendo traduzida a vários idiomas.
Um pouco desse comprometimento pode ser observado nessa obra, em que o bosque presente no título se articula em várias camadas de sentido: sem dúvida, trata-se do bosque físico, com todas suas cores, formas e cheiros, mas também se constitui como um território livre para a imaginação, composto por seres reais e imaginários, capazes de disparar inúmeras visões e histórias.
Essa riqueza de perspectivas se apresenta não apenas na escritura de Matute, mas também na constituição física e imagética do livro, posto que, como já indicamos, além do caderno ilustrado com os fragmentos de seu discurso, a obra inclui nove ilustrações em forma de carta de baralho gigante, criadas por Elena Odriozola.
A cores predominantes nesses cartões são o vermelho e o dourado, o que cria uma fenda entre o real e o maravilhoso, que se embebem de vermelho profundo e de dourado cintilante. A proposta desse conjunto de cartões é que o leitor possa brincar com sua ordem, criando inúmeras histórias a partir de sua manipulação.
Essa proposição dos cartões remonta ao século XIX, nos chamados “Mioramas”, palavra inventada para referir-se aos jogos de cartões ilustrados, cujo tema remetia, fundamentalmente, a recortes de distintas paisagens, de modo que o leitor poderia criar sua própria paisagem, numa conjunção entre jogo intelectual e imagético.
Não cabe dúvida de que En el bosque eleva a uma potência estética e narrativa infinita tal ideia do século XIX, pois, ao manipular seus cartões, qualquer leitor, de qualquer idade, pode combinar milhares de histórias, posto que a mágica e a beleza não estão limitadas a uma faixa etária específica e isso pode ser comprovado por essa obra cálida, afetiva, tátil e encantadora. Imperdível!