Leitora: Margareth Santos
A obra Migue hace un libro nasce de uma experiência familiar do autor Jesús Ortiz que, em determinado momento, expôs numa aula de sua filha de seis anos um projeto didático de como fazer um livro. A partir dessa exibição, o escritor começou a formular a obra em questão, que o levou a convidar o premiado ilustrador Kike Ibañez para executar a ilustração do volume.
O relato nos conta a história de um menino chamado Migue que quer ser jogador de futebol, quando cresça. No entanto, quis o destino que, ironicamente, quebrasse uma perna no verão, em plenas férias. Esse infortúnio faz com que o personagem passe a prestar atenção ao cotidiano de sua casa e ao trabalho de seus progenitores, especialmente no caso do pai, escritor que passava boa parte do tempo encerrado no escritório, dedicado aos livros que compunha.
Em uma combinação de competitividade e ócio, Migue decide escrever um livro que, em sua cabeça, seria melhor que o do pai, sempre confinado em seus afazeres. A aventura ganha o incentivo de sua irmã, Susi, que lhe apresenta um manual de instruções intitulado Cómo hacer un libro rápidamente, do fictício autor Prof. Jamie O´Hara. A partir daí começa um jogo metalinguístico que corre em paralelo: por um lado, está o manual contido no livro, e, por outro, a competição entre filho e pai, que pressupõe um desejo de superioridade de criação por parte de Migue.
Toda essa corrida pela constituição de um livro autoral e surpreendente articula-se entre a rejeição do pai de Migue ao passo-a-passo que o filho vai seguindo: primeiro o menino se debruça sobre as instruções do manual de O’Hara para armar o suporte da obra com folhas A4 em branco; na sequência, O’Hara impõe uma história própria e cabe a Migue apenas ilustrá-la. O pai reage com desdém. Decepcionado, o menino continua sua busca por algo autoral, no entanto, o segundo passo do manual impõe uma história conhecida, O traje novo do imperador. Uma vez mais, o pai desconsidera a obra do filho. Por fim, chega a última parte dos ensinamentos, em que Migue se vê diante do desafio de criar um relato original, a partir dos caminhos instrutivos antecedentes.
Ao final do livro, Migue, com sua perna quebrada, consegue apresentar algo próprio ao pai e trazer-lhe um ar de novidade em seu labor. Talvez essa seja a marca positiva do livro: instaurar uma competição saudável no âmbito da capacidade criativa. À competição aliam-se as ilustrações que, em seu toque naïf, configurado em cores e formas supostamente infantis, colaboram para a verossimilhança da disputa.
No entanto, a competição não instaura o diálogo entre pai e filho, pois a obra termina apenas com a surpresa do progenitor. Ademais, Migue hace un libro às vezes peca pelo excesso de didatismo, perde-se em construções a partir de modelos impostos, como o espelhamento em histórias pré-concebidas, a exemplo da fábula A roupa nova do imperador e em estratégias por demais conduzidas e infantilizadas, como se a criança de hoje em dia precisasse de suportes constituídos de redundâncias e ênfases.
Mas, há de se dizer que a inciativa apresenta um projeto estimulante, embora o andamento seja tautológico e impositivo, pois incita, com suportes apropriados de estrutura narrativa, à construção de relatos autorais. Talvez esse seja o grande predicado de Migue hace un libro: o incentivo à escritura precoce e criativa.
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