Esperando el amanhecer, ganhadora do XV Prêmio Internacional Compostela para Álbuns Ilustrados, nasce de um horror e de um desejo. O primeiro responde ao assombro que surge à raiz das queimadas continentais que se formaram em 2019 e que devastaram territórios amazônicos no Brasil, no Peru e na Bolívia. O segundo está representado pela condução da obra, que exige uma tomada de consciência em relação aos desmatamentos e à destruição da flora e fauna mundo afora, mas que aqui aparece representada pelo espaço amazônico.
Tal preocupação se traduz em um livro quase telegráfico, em que texto e imagem se fundem a partir da expectativa e do estarrecimento: por um lado, a esperança está delineada sempre pelo olhar animal, que aparece humanizado ao longo do livro; por outro, o espanto salta aos olhos dos leitores (dos humanos e, como sugere a narração, dos animais também, os mais afetados pelas queimadas) que enxergam nas cores aveludadas que Anchorena nos brinda as distintas facetas da aniquilação.
Para tentar dar conta desses diversos olhares, a construção de Esperando el amanecer, entre a “percepção” animal e a humana, se perfaz em cores estonteantes e muito refinadas, que se equilibram em uma oposição pouco usual entre escuridão e claridade.
Se num primeiro momento a escuridão acompanha as selvas em sua umidade e densidade, a claridade surge como um novo elemento que, na narrativa, se assemelha ao sol. Mas que, de fato, desponta de maneira contundente como o fogo que devasta. Os animais humanizados, imersos numa escuridão que parece não ter fim, se perguntam pelas razões que varreram da selva componentes tão cotidianos como a chuva, a visão da lua e a do sol. Rapidamente, rumores se espalham no rastilho da incompreensão: confusão de sentidos, percepções equivocadas de calores que chegam intensos, mas que não pertencem ao sol habitual.
Essas indagações provocam uma procissão épica em busca do amanhecer, que nasce com seu signo de expectativa, expresso no título da obra. No entanto, a esperança se converte em medo e fuga assim que os animais se deparam com o “sol” que não esquenta, mas queima.
As pontas épicas: busca e fuga se detêm no momento em que começa a chover. E embora as gotas salvadoras não restituam a paisagem original, elas acalantam a possibilidade de salvamento, ainda que parcial, em meio a tanta destruição.
Por fim, ainda que o tema da obra possa parecer “habitual”, o tratamento do colorido e das formas poéticas desenhadas ao longo do volume lhe confere atualidade e peculiaridade para abordar um assunto tão flamante e necessário, em cujo filão, o de matérias candentes, a editora galega Kalandraka tem se destacado nos últimos anos.